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Estados úmidos da matéria

Estados úmidos da matéria

Sinopse

Barthes diz que não foram os pintores que inventaram a fotografia, mas os químicos. Eu diria que, antes dos químicos e dos pintores e daquele velho ancestral que encheu as paredes de uma caverna de bisões avermelhados, animados pela luz e pela sombra, foram os poetas, esses seres de danação, essas crianças terríveis, que inventaram essa presença, para além da metáfora, da coisa, essa presença viva que certifica um movimento em sua própria ação de existir, que mais que o congela, atesta-o, que mais que o atesta, nomeia-o como real. 

É isso o que me ocorre ao ler a poesia de Marcílio Godoi nesta belíssima estreia, Estados úmidos da matéria. Sinto (e sentir é corpo e intelecto) que várias cenas, de tempos e mundos diversos, foram capturadas e colocadas num diorama para que reexistam continuamente. Mas, no caso dessa poética, não se trata do capricho de um mestre chinês ilusionista com seu circo extraordinário. Pelo contrário. Trata-se de revelar tesouros, preciosidades que, de outro modo, seriam fugidias; singularidades que, em outra forma de existir, estariam ocultas no cascalho do tempo.

Simultaneamente, parece ser de cinema que se fala aqui, porque não há imobilidade (nunca houve, aliás). Tudo corisca, tudo faísca em luz própria: a menina de dentro do espelho, a vendedora de panos de prato, o jardim que floresce no forro de um casaquinho azul, o menino e seu cavalo, que, de certo modo, cabe na sala de um apartamento. Portanto, sou obrigada a me desfazer das imagens (sempre elas) que escolhi. Nem fotografia, nem pintura, nem cinema, a umidade deste livro é a umidade do que está vivo, do que pulsa e flui, do que corre para o mar ou para o coração, que é quase tudo a mesma coisa, o mesmo destino. É poesia. E da melhor estirpe.

Leia-se.

Micheliny Verunschk